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Crítica: As linhas da minha mão de João Dumas

Foto do escritor: Lara Eliza FerreiraLara Eliza Ferreira

Foto: João Dumas / Frame de filme


De certo não há moldes exatos sobre como e quando fazer uma análise de filme. Após assisti-lo ? Após dormir com as memórias dele? Talvez, a ideia de fazer o leitor enxergar que está prestes a consumir uma análise ou crítica de filme não seja o ideal mas como descrito em uma das linhas acima: Não há moldes ! Pensando nisso, começo a escrever essa resenha logo após assistir o filme pois esquecer algum detalhe marcante, seria imperdoável.


João Dumas ao dirigir "As linhas da minha mão" foi capaz de ludibriar o espectador durante o início compassado, o meio intrigante e o fim enigmático e talvez enigmático seja uma descrição para a narrativa incorporada no filme do início ao fim. Descobrir que o filme foi vencedor da Mostra de Cinema não foi nem um pouco inesperado.


O início compassado possivelmente é um dos maiores acertos da direção de Dumas. Seguindo uma cadência lenta e continua entre yoga e ritmo, dança e ritmo, calmaria e ritmo, reflexo e ritmo e ausência de si e ritmo, Vivian, a protagonista do longa, ajuda a construir uma narrativa etérea que inicialmente é decadente, lenta, pouco instigante, atravessada pelo significado que estabelecemos ao cinema independente, no entanto, colide com uma sequência instigante que futuramente é ofertada ao espectador.


Conforme "o andar da carruagem", é possível conhecer uma Vivian intensa, tóxica que por muitas vezes tem uma companhia até então sem nome e essa companhia, dialoga questões a cerca da produção da artista. A medida que viviam conversa com sua companhia, uma tela preta cobre o cinema e apesar de não saber no momento, essa tela preta seria um marcador, não só de perspectivas mas de momentos, espaços e relações de Vivian.


Na iluminação da tela, Vivian está lendo roteiros e programações do trabalho do ano de 2021 e nesse momento ela professa sua fé e nos direciona para o que talvez seja o foco central de sua vida: o encantamento de sua mãe. Foi interessante ouvir esse termo porque ontem mesmo realizei uma entrevista e o entrevistado que era indígena, me contou sobre o significado do encantamento para os indígenas que está muito atrelado a ir livre, viver entre as árvores. Para nós, não indígenas é morrer.


Alguns pontos foram centrais pra mim. Como por exemplo, o momento em que Vivian se aprofunda na sua doença psicológica que só é citada após uma longa conversa o que traz uma sensação de intimidade com o espectador que em determinados momentos, se sente o ouvinte de Vivian. A única pessoa que está disponível para escuta - la. Se a tela preta significa marcações de tempo, Vivian narrar isso significa uma aproximação. Conosco ? Com seu companheiro ? Consigo mesmo? A todo momento, é duvidoso para o espectador se as narrativas de Vivian são reais, frutos de delírios ou invenção.


A medida que Vivian narra seus acontecimentos passados como o encantamento da mãe, desavenças familiares, encontros amorosos, viagens a Itália, busca e uso de maconha, é possível sentir o peso da dor e alegria de cada lembrança. Parece ser real. No entanto, é difícil saber se são reais não só por muitas vezes serem histórias fantasiosas e ricas em detalhes mas pela bipolaridade ser uma crescente no seu ser. Nos créditos finais, descobrimos que a personagem carrega mesmo nome de quem a interpreta. O que para nós é ao mesmo tempo avassalador e instigante pela incerteza da verdade e precisão dos eventos narrados.


Um filme de muitas possibilidades e talvezes", desenvolve conexões e questões consigo mesmo. Talvez o ponto alto pra mim, seja a desavença de Viviam com sua Tia sem nome. Sua tia é divorciada e parece não superar a separação e viviam questiona isso. A tia, diz que ela "Desconhece o amor por só conhecê-lo através do sexo".


O fim, repleto de marcantes alegorias, através de fotos que constroem uma narrativa é instigante. As fotos, nem sempre nítidas, dão forças as histórias contadas. E após a tela preta que novamente faz uma marcação de tempo, a pergunta é: E agora ? As linhas da minha mão é um filme questionador. Uma catarse!


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